O Supremo Tribunal Federal (STF) julga, nesta quarta-feira, uma ação que trata das regras de investigação sobre acidentes aéreos no Brasil. Entre os itens, o processo questiona a limitação ao uso como prova na Justiça dos dados de apuração em caso de queda e os limites estabelecidos em lei para a polícia e o Ministério Público acessarem os destroços de aeronaves.
O processo foi apresentado em 2017 pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Em 2021, o relator, ministro Kassio Nunes Marques, votou, em plenário virtual, para validar os trechos questionados. No entanto, o julgamento foi paralisado após um pedido de vista (mais tempo de análise) de Alexandre de Moraes.
Desde então, o caso entrou e saiu da pauta do plenário algumas vezes, sem nunca ser chamado a julgamento. Após a repercussão da tragédia do avião da Voepass, o presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, colocou a ação no plenário físico como primeiro item da pauta desta quarta-feira.
O processo questiona trechos do Código Brasileiro de Aeronáutica, que foram alterados por uma lei de 2014. A norma mudou regras sobre as investigações do Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Sipaer) e o acesso aos destroços de aeronaves. Também prevê que as conclusões dos técnicos, em regra, não seriam usadas como provas em processos judiciais.
Atualmente, o Sipaer fica sob a responsabilidade do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa). A PGR questiona a precedência dada ao Sistema no acesso e na guarda de itens de interesse para a investigação, inclusive dos dados das caixas-pretas. A legislação também estabeleceu que o uso do material como prova depende de decisão da Justiça, além de restringir o acesso aos destroços das aeronaves acidentadas.
Segundo Janot, os trechos alterados violam direitos fundamentais como o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. “Trata-se de dados que dizem respeito a pessoas atingidas por acidentes e incidentes aéreos, a seus familiares e às funções institucionais desses órgãos. A proibição legal de acesso suprime o direito de defesa garantido constitucionalmente”, diz o procurador na ação.
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A PGR alega que uma eventual responsabilização de empresas aéreas e fabricantes pode ser prejudicada por conta da legislação vigente. “Nas investigações aeronáuticas administrativas, não é raro que equipamentos de aeronaves sinistradas sejam enviados aos próprios fabricantes para análise. Isso é perfeitamente compatível com as finalidades e princípios dessa investigação, que busca prevenir acidentes e incidentes, mas não é, em princípio, com a busca da verdade em processos cíveis e, principalmente, criminais”, afirma.
“Falhas nesses produtos podem gerar responsabilidade civil e até criminal de fabricantes e seus prepostos, e não se pode admitir que partes tendencialmente interessadas em se forrar a tais responsabilidades realizem tais exames sem acompanhamento devido de peritos do sistema de Justiça”, completa o documento encaminhado ao STF.
Nesta segunda-feira, o ministro Luís Roberto Barroso recebeu os dirigentes da Azul, Gol e Latam, além do presidente da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Tiago Sousa Pereira, e representantes de entidades do setor para debater a alta litigância na aviação. A reunião já estava agendada antes do acidente da Voepass e tinha como objetivo discutir o alto número de processos judiciais que impactam o custo das passagens, os investimentos e a oferta de voos em todo o país.
O presidente do STF explicou que o processo sobre as regras de investigação já era tratado como prioridade pela Corte, mas que, agora, se transformou em urgência. “Desde o início da gestão, o processo foi incluído em pauta diversas vezes e não foi julgado. Diante do acidente, o que já era prioridade para a pauta da presidência, se tornou mais urgente”, disse após o encontro.
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