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Morte de detento por suspeita de overdose é investigada em Minas

A Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp-MG) apura a causa da morte de mais um detento sob custódia no Presídio Antônio Dutra Ladeira, em Ribeirão das Neves, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Elias Martins da Silva, de 40 anos, estava internado desde 15 de abril no Hospital São Judas Tadeu, na mesma cidade. Ele morreu na sexta-feira (19/4).

A morte de Elias se soma a outras 13 que estão sendo apuradas pelo Governo de Minas. A suspeita é que os homens tiveram overdose de uma droga sintética conhecida como K – K2, K4 e K9. As mortes chamam atenção e acendem um alerta sobre o aumento do uso recreativo das substâncias já conhecidas por ter alto poder destrutivo e a sua entrada no sistema penitenciário de Minas Gerais.

Como já noticiado pelo Estado de Minas, entre dezembro de 2023 e março de 2024, seis pessoas morreram no Presídio Antônio Dutra Ladeira. Situação semelhante também foi encontrada no Presídio Inspetor Martinho Drummond, também em Ribeirão das Neves, onde em dez dias sete mortes foram registradas. De acordo com o governo de Minas, em nenhuma das ocorrências os presos apresentavam lesões aparentes. O Departamento Penitenciário de Minas Gerais (Depen) e a Polícia Civil apuram a suspeita de que todos os privados de liberdade faziam uso de K4 e K9.

As drogas da família “K” são produzidas a partir de um grupo de substâncias sintéticas produzidas em laboratório com efeito mais agressivo e potente que o THC, encontrado na maconha. O efeito das “K” são mais nocivos que o da planta, podendo levar taquicardia, alucinações, convulsões, ansiedade, movimentos estereotipados, dependência e morte.

“As causas das mortes estão em apuração administrativa pela unidade prisional e, também, em apuração pela Polícia Civil. Todos os procedimentos necessários nos casos de óbitos foram realizados pela unidade prisional, que aguarda laudos da perícia”, informou a Sejusp.

Preocupação antiga

Apesar de ser uma droga “nova” no mercado, quando comparado a outras substâncias ilícitas como maconha, crack e cocaína, as drogas “K” começaram a ser vistas nas penitenciárias mineiras em 2020. Maikon Vilaça, presidente da Comissão de Assuntos Penitenciários da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas, conta que a preocupação da segurança pública com os entorpecentes não começou agora. De acordo com o advogado, a quantidade de óbitos por overdose registrados tem aumentado de forma proporcional ao aumento da circulação dos sintéticos.

“A preocupação com as drogas ‘K’ não é só da OAB e sim da sociedade em geral. Por serem sintéticas, existe uma facilidade em entrar com elas em qualquer local. A nossa maior preocupação é que é uma droga que causa um efeito colateral muito alto e eleva a morte”, diz Vilaça.

Sobre os óbitos registrados nos presídios de Ribeirão das Neves, o representante da OAB afirma que a comissão enviou ofício ao Ministério Público, à juíza responsável pela comarca da cidade e ao Conselho Nacional de Justiça, com as informações e pedindo fiscalização e apuração dos fatos. Além disso, o órgão espera o laudo pericial com a causa da morte para apurar se aconteceram em decorrência do consumo dos entorpecentes.

Brecha na fiscalização

Em 24 de março, uma mulher de 30 anos foi presa ao tentar entrar com cartelas de K4 no Presídio Bicas I, em São Joaquim de Bicas, também na Grande BH. As drogas foram encontradas durante o procedimento de revista com scanner corporal. Durante o processo, uma policial penal percebeu algo suspeito na mãe da acompanhante. Questionada, ela informou que era o cadastro de visitação. No verso da folha de cadastro, em um saco plástico, a policial encontrou quatro cartelas de entorpecente, no tamanho de folhas A4. Cada uma continha 500 unidades de K4. 

A apreensão de drogas em presídios é comum em todo o país. Elas são encontradas dentro de marmitas de comida, malas ou até junto ao corpo de visitantes. No entanto, encontrar cartelas de substâncias da família “K” não é tão habitual assim. Wladimir Dantas, vice-presidente do Sindicato dos Policiais Penais do Estado de Minas Gerais (Sindppen-MG), explica que a substância é difícil de ser identificada e os policiais ainda não tiveram treinamentos específicos para seu reconhecimento.

“Além de ser uma novidade, eles estão a colocando em folhas e fazendo com que a sua fabricação burle o sistema de segurança. E isso dificulta até na identificação e leva risco para os nossos profissionais porque se eles tiverem algum contato, dependendo do manuseio por exemplo, se for na pele, ele pode ser contaminado e prejudicado”, explica.

As drogas “K” podem ser diluídas em papel ou qualquer tipo de material. Além disso, o fabricante por torná-la incolor e inodora, ou seja, sem cheiro se tornando praticamente imperceptível. O Sindppen acredita que os casos de overdose pelas drogas “K” são maiores do que os já computados pelo Estado. A reportagem questionou a Sejusp sobre quantos atendimentos médicos por sintomas de overdoses foram realizados nas penitenciárias de Minas Gerais, em 2023 e 2024, mas até a publicação não obteve resposta. A pasta informou que vai consultar a área técnica sobre a “possibilidade de levantamento dos dados solicitados”. 

“Nós não duvidamos que o número de overdoses causadas pela K2, K4 e K9 pode ser que seja muito maior do que as informadas oficialmente. Mas para que ele seja certeiro é preciso fazer exame toxicológico em todos que apresentam os sintomas. O que nós temos que fazer é criar um mecanismo e aparatar nossas equipes para saberem lidar com esse tipo de droga”, afirma Dantas.

Para tentar solucionar o problema, o sindicato afirma que já pediu ao governo estadual para que as equipes sejam treinadas para indicar o produto. Mas, até o momento, não teve um posicionamento assertivo a isso já que não há muitas informações sobre a droga.

“É novidade para todo mundo, para qualquer órgão de segurança pública do país. Até onde nós tomamos conhecimento o preço dela está em preço de mercado com as outras. Ela pode ter um poder letal grave, mas também tem um poder viciante grande também. Temos que ter um treinamento rotineiro para todos os profissionais. E enquanto isso, temos uma falta de servidores muito grande. Precisamos de mais policiais, se não ficamos muito vulneráveis”, relata.

Droga zumbi

Apesar de já estar circulando pelo país a, pelo menos, quatro anos, as K2, K4 e K9 podem ter “vida útil” curta. É isso que defende o especialista em segurança pública, Luis Flávio Sapori, uma vez que são altamente viciantes e podendo levar o usuário à morte. Para ele, sua inviabilidade econômica vai fazer com que traficantes decidam não comercializá-la. 

“Esse tipo de entorpecente é uma novidade recente no Brasil e esse poder letal dela, por overdose, vai inviabilizar economicamente sua venda pelo país. Eu duvido muito que os traficantes brasileiros vão querer vender um produto que mata cliente, então não vejo risco dessa droga conseguir muito espaço mercadológico no país”, explica Sapori.

Conforme publicado pela BBC News Brasil, desde o ano passado o Primeiro Comando da Capital (PCC) proibiu a vida das drogas “K” em bocas de fumo comandadas pela facção. A decisão foi tomada depois que líderes da organização perceberam que o uso exagerado de K2 e K9 chamavam atenção de órgãos de segurança pública.

“É prematuro dizer que estamos enfrentando uma epidemia de consumo dessas drogas no sistema prisional. De qualquer maneira, esse número de mortes oficialmente registradas, com o governo assumindo isso, é preocupante. No sentido do rigor das fiscalizações das visitas, dos produtos que estão entrando nas penitenciárias mineiras. Mas de qualquer forma, é diminuir as oportunidades da entrada dessa droga no sistema prisional. Ela tá se mostrando muito maléfica”, conclui Sapori.

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