Em meio ao aumento dos casos de dengue em todo o país, que atingiram mais de 1,3 milhão de pessoas em 2024, o Tribunal de Contas da União (TCU) está fiscalizando as políticas públicas de combate ao mosquito causador da doença. O órgão apontava, desde 2016, falhas nas ações e vinha pedindo providências. Relatório julgado pelo Acórdão 2562/2019, e relatado pelo ministro Augusto Nardes, apontou, entre as doenças negligenciadas, a dengue.
De acordo com o relatório, nos últimos 20 anos, houve diminuição na mortalidade por várias doenças, como malária, leptospirose, toxoplasmose, hanseníase e esquistossomose. Por outro lado, aumentou a mortalidade por leishmaniose e surtos de dengue e febre amarela.
Além disso, há um processo aberto, neste ano, em andamento, que investiga se o governo federal deixou de aplicar recursos do Programa 0015 — Prevenção e Controle da Dengue, especialmente para a compra de vacina importada contra a doença. Esse processo foi iniciado pelo senador Marcos Rogério (PL-RO) e está sob a responsabilidade do ministro Antônio Anastasia.
De 2016 a 2024, foram realizados dois ciclos de acompanhamento da dengue pelo TCU, e está em andamento um terceiro. A Secretaria-Geral de Controle Externo do tribunal informou ao Correio que o relatório do terceiro ciclo do trabalho está em fase de conclusão, e houve necessidade de sua atualização — especialmente para contemplar o surto de dengue, que se iniciou no fim de 2023, e que ainda persiste. A relatoria do processo é do ministro Jhonatan de Jesus.
A secretária-geral de Controle Externo do TCU, Ana Paula Sampaio, reforçou, em entrevista ao programa CB.Poder, que o Tribunal vem atuando para que a administração pública torne mais eficientes os programas de combate às doenças como a dengue. “Nesse caso, estamos monitorando. Nosso trabalho de fiscalizar as políticas públicas apontou, em relatórios, que ocorreram falhas”, frisou.
Histórico
O processo começou sob relatoria do ministro Bruno Dantas, atual presidente do TCU, com o primeiro ciclo de fiscalização (apreciado pelo Acórdão 1073/2017-Plenário), que identificou alguns riscos e problemas na política pública de combate ao mosquito Aedes aegypti. Foi determinado ao Ministério da Saúde, à época, que apresentasse um plano de ação para resolver ou minimizar essas questões. E reiteradamente solicitado o aprimoramento das ações nos últimos anos.
Entre as falhas identificadas ao longo do tempo, estavam a falta de informações e dados que permitam acompanhar como o recurso federal enviado a estados e municípios estava sendo usado; a ausência de ações para garantir que os agentes de combate às endemias recebessem o treinamento mínimo exigido por lei; e a carência de medidas para viabilizar a boa gestão dos insumos enviados pelo Ministério da Saúde para o combate ao mosquito.
A realização do trabalho que começou em 2015 foi motivada pela introdução do vírus zika no Brasil, e o consequente aumento dos casos de microcefalia — outra infecção causada pelo Aedes aegypti. A partir de agosto de 2015, o aumento da microcefalia em recém-nascidos, principalmente na Região Nordeste, chamou a atenção das autoridades. O TCU passou, então, a acompanhar o combate ao mosquito transmissor dessas doenças.
Pouco antes da pandemia de covid-19, houve o início do terceiro ciclo do acompanhamento. No entanto, o trabalho teve de ser interrompido, pois tanto a equipe técnica do TCU quanto os gestores de saúde tiveram que direcionar os esforços para as demandas relacionadas ao coronavírus. A Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente (SVSA), que era a principal responsável por fornecer informações sobre a covid-19, intensamente demandada pelo Tribunal durante a pandemia, também era a unidade responsável por fornecer dados sobre a dengue. Após o fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional, o acompanhamento foi retomado pelo TCU.
O ministro Augusto Nardes disse ao Correio que o agravamento da dengue no país se deve “a falhas na política de prevenção”. Conforme disse, o TCU apontou isso. Ele também alerta para a questão de descontrole urbanístico.
“Há um problema sério de crescimento urbano desordenado que traz, entre os efeitos muito negativos, a proliferação da dengue. Vejamos o Distrito Federal e Entorno. A capital federal deveria ser exemplo para o país e está sendo muito atingida pela dengue”, destacou.
Ministério alertou estados e municípios
O Ministério da Saúde remeteu a nota ao Correio, esclarecendo os esforços que tem realizado para mitigar os efeitos e prejuízos causados pela dengue em todo o país.
“Desde 2023, a atual gestão do Ministério da Saúde está em constante monitoramento e alerta quanto ao cenário epidemiológico da dengue no Brasil, coordenando uma série de ações para o enfrentamento da doença em todo o território nacional. Ao longo do ano passado, foram feitas reuniões com gestores municipais e estaduais, notas de alertas sobre o possível aumento de casos, a instalação da Sala de Situação, regularização dos estoques de insumos para o enfrentamento da doença, a primeira etapa da campanha nacional de combate ao mosquito e o repasse de R$ 256 milhões para reforço das ações de vigilância aos estados e municípios.
Em 2024, a pasta ampliou o repasse em até R$ 1,5 bilhão para apoiar estados e municípios em situação de emergência, reforçando a assistência e o cuidado integral pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Além disso, a pasta coordena, em parceria com o Conasems, o treinamento e formação dos profissionais de saúde e dos agentes de combate às endemias em todo o país.
O Ministério da Saúde também instalou o Centro de Operações de Emergência contra a Dengue (COE Dengue) para coordenar, em conjunto com estados e municípios, as estratégias de vigilância frente ao aumento de casos no Brasil, permitindo mais agilidade no monitoramento e análise do cenário para definição de ações oportunas para o enfrentamento da dengue.
A vacina, pela limitação de doses disponíveis para o SUS pelo fabricante, é uma das estratégias que se soma às demais ações de combate à dengue que já estão em andamento. O Ministério da Saúde adquiriu todo o estoque disponível de vacinas da dengue do laboratório fabricante — 5,2 milhões de doses, que serão entregues entre fevereiro e novembro de 2024.
Além dessas, também serão distribuídas 1,32 milhão de doses fornecidas sem custo ao governo federal. Para 2025, 9 milhões de doses que estavam disponíveis também foram compradas. É importante reforçar que outras aquisições podem ser feitas se houver nova disponibilidade de doses ao Ministério da Saúde”. (Colaborou Mayara Souto)
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