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Crise climática: “Negacionismo roubou 30 anos de ações efetivas”, diz especialista

Convidada do Podcast do Correio desta sexta-feira (10/5), a bióloga Mercedes Bustamante, ex-diretora da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), professora da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisadora de mudanças climáticas, explicou como as questões urgentes e que cercam a atual crise climática têm provocado tragédias como a do Rio Grande do Sul.

Na bancada com os jornalistas Mayara Souto e Victor Correia, a bióloga foi questionada sobre a mobilização global para enfrentar os efeitos das mudanças climáticas, em que foi enfática ao apontar o negacionismo climático como um obstáculo. “O negacionismo climático nos roubou quase 30 anos de ações efetivas contra mudanças do tempo. No lugar de estarmos discutindo as soluções e as implementações, nós tivemos que explicar a parte mais básica da ciência e do clima. Isso toma tempo dos pesquisadores e toma espaço na mídia que poderia estar sendo usado para discutir soluções”, critica.

As chuvas intensas que causaram a tragédia no Rio Grande do Sul têm interação entre frentes frias, massas de ar quente seco e os impactos do aquecimento global, que resultaram em precipitações sobre uma área extensa do estado. De acordo com a especialista, há a possibilidade de prever e lidar com desastres naturais como enchentes, com planos de contingência e adaptação. Ela enfatizou a necessidade de alojamentos seguros, suprimento de água e a proteção das infraestruturas críticas para mitigar os impactos devastadores desses eventos.

“O Rio Grande do Sul já era colocado nos modelos climáticos como uma região que sofreria muito com os extremos, tanto de secas, quanto de inundações. Eu espero que essa seja a lição aprendida que, a duras penas, vão ter de haver planos de contingência. A gente precisa ter alojamentos para mulheres e crianças. A gente precisa ter condições e suprimento de água. As infraestruturas críticas são todos aqueles setores que causam um colapso geral da economia e da sociedade. Transporte, comunicação, água potável, sistema de saúde, distribuição de alimentos. Não basta que as pessoas saiam de casa”, diz.

A relação entre mudanças climáticas e urbanização tem prejudicado cidades impermeabilizadas e mal preparadas para chuvas intensas, que tendem a ser cada vez maiores. Bustamante sublinhou que repensar o planejamento urbano e investir em infraestruturas resilientes é o que deve ser feito para enfrentar os novos padrões de precipitação.

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Urbanização

“Uma das questões que vem sendo discutida quanto ao aquecimento global é qual a relação dele com a intensificação e com a maior frequência de fenômenos. Vão ter mais extremos de temperatura que geraram essas grandes chuvas. É importante pensar que o nosso processo de urbanização, a forma como nós construímos as cidades e ocupamos os territórios, foram baseadas num clima que a gente não vai ter mais. Aqueles eventos que talvez acontecessem uma vez a cada 100 anos, agora, a cada grau de aquecimento, vão aumentar em frequência e intensidade. Aquilo que era algo raro vai se tornar mais frequente”, aponta.

Ao discutir a reconstrução de áreas afetadas por desastres naturais em novas localizações, a especialista explicou a complexidade do processo e a necessidade de considerar não apenas aspectos físicos, mas também emocionais e sociais. Por isso, a importância de prevenir desastres futuros e repensar o desenvolvimento urbano de maneira sustentável.

“Quando você desloca as pessoas, não é simplesmente construir uma casa nova, é deslocar memórias e histórias que estão associadas àquele território. Há milhões de pessoas vivendo em regiões que são consideradas vulneráveis depois do processo de evacuação ou migração. O Brasil precisa estar atento. Precisamos ter prevenção de desastres e melhoria da urbanização. Quando acontecem essas enchentes, há um problema crítico que é a qualidade da água. Boa parte das cidades brasileiras ainda têm problema de saneamento básico”, observa.

“Toda ação é válida. Tem que ver o seu espaço de ação e atuar. Não é o governo sozinho e não é a sociedade sozinha. Se não for uma ação coletiva e ampla, vai demorar mais tempo”, conclui.

*Estagiária sob a supervisão de Mariana Niederauer

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