Com prejuízo recorde, risco de despejo em 200 imóveis por falta de pagamento e implementando medidas de urgência para evitar insolvência, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) realiza neste domingo (15) um concurso público para a contratação de 3.511 funcionários. Mais de 1,7 milhão de candidatos se inscreveram para cargos com salários iniciais entre R$ 2,4 mil e R$ 10,3 mil.
Em seu terceiro ano consecutivo com as contas no vermelho, a estatal contabilizou, de janeiro a setembro, prejuízo de R$ 2 bilhões, o maior já registrado para o período desde a sua fundação.
Documento interno da estatal que veio a público em outubro revela que, em razão da deterioração das contas, a estatal decretou um teto de gastos para o ano, de R$ 21,96 bilhões. A expectativa inicial era de receitas de R$ 22,7 bilhões em 2024. Agora, o número foi revisto para R$ 20,1 bilhões. O saldo em caixa, diz o ofício, deve ficar 83% menor que o reportado no início de 2024.
Mesmo que o teto de gastos seja cumprido, ainda haverá um prejuízo de ao menos R$ 1,7 bilhão. Mas, caso as contas mantenham o ritmo atual, o rombo será maior que o recorde registrado em 2015, durante o governo Dilma Rousseff (PT), de R$ 2,1 bilhões.
Desde fevereiro de 2023, a estatal é presidida por Fabiano Silva dos Santos, integrante do Prerrogativas, grupo de advogados simpáticos ao presidente Lula que atuou fortemente contra as acusações de processos da Lava Jato. Ele também é conhecido como “churrasqueiro de Lula” por sua proximidade com o petista e tem relação de amizade com o deputado federal Zeca Dirceu (PT-PR), filho do ex-ministro José Dirceu.
Silva dos Santos assumiu com a promessa de “desmilitarizar” a estatal, priorizar a competitividade e modernização e lutar para que o projeto de lei de privatização, parado no Senado, seja descartado.
Administração tenta evitar insolvência
Para evitar que a empresa entre em “estado de insolvência”, a administração estabeleceu, em ofício, “medidas urgentes” para “sanar a delicada situação econômico-financeira dos Correios, com vistas à recomposição das reservas necessárias ao seu funcionamento”.
Entre as providências, adotadas com base no limite de gastos, estão a suspensão temporária das contratações por, no mínimo, 120 dias e a renegociação do valor global dos contratos vigentes com redução no mínimo em 10% dos valores bloqueados em 2024 e 2025. Os contratos vigentes a partir de outubro deverão ser bancados com utilização de recursos oriundos da economia realizada.
Foi a forma encontrada para impedir o risco de despejo de 200 imóveis da estatal por falta de pagamento. O documento de notificação, recebido em outubro, mostra que os Correios tinham dívidas de R$ 9,5 milhões com pagamentos atrasados de condomínio e IPTU, além de demandas judiciais e TCDs (reconhecimento de dívidas).
São 122 imóveis com ação de despejo em andamento que podem ser executadas desde 30 de novembro. Há outros 127 contratos com prazo a vencer até o fim do ano. Entre eles estão 206 agências dos Correios, 34 centros de distribuição domiciliar, três centros de tratamento de cartas e encomendas e um centro de encomendas.
A diretoria pediu para redirecionar R$ 1,5 bilhão do aluguel de um centro de tratamento de cartas e encomendas em Contagem (MG), interditado em outubro, para renovar os contratos. A medida não surtiu efeito. A justificativa dos Correios para a interdição foi um problema de estrutura. Mas o proprietário, o fundo de investimentos TRBL11, não reconheceu o problema e cobrou laudos técnicos. No dia 6, a Defesa Civil do município de Contagem liberou o uso do galpão pela estatal.
“Taxa das blusinhas” e gestão Bolsonaro geraram déficit, diz estatal
Entre os motivos alegados pela estatal para o prejuízo está a tributação de 20% sobre as compras estrangeiras até US$ 50, que ficou conhecida como “taxa das blusinhas”. Os Correios tiveram menos encomendas para despachar para endereços no Brasil e a receita, por consequência, caiu em R$ 1 bilhão.
A tributação – aprovada como um “jabuti” dentro de um projeto relacionado ao setor automotivo – entrou em vigor no início de agosto de 2024, mas começou a ser cobrada no dia 27 de julho em duas das maiores varejistas estrangeiras que operam no Brasil, a AliExpress e a Shopee.
A administração da estatal também atribuiu parte do prejuízo atual à gestão do governo anterior, embora a empresa tenha registrado lucro em três dos quatro anos daquela gestão. E o resultado do quarto ano foi influenciado por uma decisão da atual administração.
No último ano do governo Bolsonaro, os balanços foram afetados por uma ação trabalhista de R$ 614 milhões, da qual a administração petista resolveu não recorrer, em abril de 2023, início da gestão de Silva dos Santos.
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) rebateu a acusação da estatal. “Os Correios começaram a dar lucro no governo Temer, pouco mas deu. Depois, foi lá pra cima o lucro. Agora, você pega o balanço oficial que mostra que lá atrás, no governo Dilma, tinha um passivo trabalhista. O governo Temer não reconheceu esse passivo, no nosso governo também não reconhecemos. Agora, em 2024, o governo Lula reconheceu independente do deslinde da decisão judicial e pagou, aproximadamente, R$ 1 bilhão para os advogados que defendiam os servidores dos Correios”, disse Bolsonaro em entrevista concedida ao canal Auriverde Brasil na terça-feira (10).
“Pegaram esse balanço negativo de R$ 1 bilhão e botaram na minha conta. Então, nos quatro anos em que os Correios foram superavitários comigo, passou a ser deficitário no último ano porque no Brasil até o passado é incerto”, completou o ex-presidente.
Gestão petista inaugurou prejuízo
O histórico das contas dos Correios mostra piores resultados nos anos de administração petista. A empresa foi lucrativa até 2013, na gestão de Dilma Rousseff (PT), quando registrou o primeiro prejuízo desde pelo menos o início do século. A perda naquele ano foi de R$ 213 milhões, seguida de outra de pouco mais de R$ 20 milhões em 2014.
Os rombos dispararam em seguida, somando R$ 2,1 bilhões em 2015 – recorde histórico, alavancado por problemas de gestão, gastos com pessoal, congelamento de tarifas e pela mudança na contabilização das obrigações com o chamado benefício pós-emprego, ou seja, as despesas com planos de previdência privada. Somado com o ano de 2016, último do governo Dilma, os prejuízos somaram R$ 3,5 bilhões.
A partir de 2017, por outro lado, os Correios emendaram cinco anos seguidos de lucro, durante as gestões de Michel Temer (MDB) e Bolsonaro. No período, os ganhos da estatal somaram quase R$ 4 bilhões. O melhor resultado da estatal na história foi registrado em 2021, com lucro de R$ 2,3 bilhões, alcançado em meio a programas de demissão voluntária.
Na época, os funcionários somavam 115 mil em todo o país. Hoje são aproximadamente 88 mil, o que ainda mantém a estatal como uma das que mais empregam no território nacional.
Apesar dos prejuízos, a empresa diz não haver previsão para demissões, a não ser as referentes ao Programa de Desligamento Voluntário (PDV). As contrações do concurso público serão realizadas, sem corte.
Concurso tem 1,7 milhão de inscritos
Das mais de 3,5 mil vagas do concurso de domingo, 3.099 são de nível médio e 412 de nível superior em diversas áreas. Nos dois níveis, 30% são reservadas para negros (pretos e pardos) e indígenas, e 10% para pessoas com deficiência. Mais de 1,5 milhão de inscritos concorrem a vagas de nível médio para o cargo de Agente de Correio. E 111 mil candidatos visam o cargo de Analista de Correio, de nível superior.
Para o nível médio, a prova objetiva será classificatória e eliminatória, com 50 questões de múltipla escolha de Língua Portuguesa (15), Matemática (10), Noções de Informática (10), Conhecimentos Gerais (10) e Código de Conduta Ética e Integridade (5). Para nível superior (412 vagas), as provas terão perguntas de Português (10), Matemática (5), Noções de Informática (10), Código de Conduta Ética e Integridade (5) e Conhecimentos Específicos (20).
Quem concorre a uma das vagas de nível superior fará também uma redação, de 20 a 30 linhas. Serão corrigidos apenas os textos dos aprovados no exame objetivo e que estejam classificados dentro do limite de até três vezes o número de vagas.
O local de prova pode ser consultado no site do Instituto Brasileiro de Formação e Capacitação (IBFC). De acordo com o edital, a consulta pode ser feita na aba “local de provas”.
Os exames terão início às 13h deste domingo (15), com duração máxima de quatro horas. Os portões serão abertos ao meio-dia e fechados às 12h45. Os candidatos devem chegar com pelo menos uma hora de antecedência, munidos de documento físico de identidade com foto e de caneta esferográfica de tinta azul ou preta. O caderno de questões poderá ser levado se o candidato sair a partir de duas horas após o início da prova.
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