O Supremo Tribunal Federal (STF) pode julgar, amanhã, a ação que discute as exigências para a realização de laqueaduras e vasectomias no Brasil. Segundo a lei atual, em vigor desde março de 2023, mulheres e homens com mais de 21 anos ou que tenham dois filhos vivos têm direito à esterilização voluntária. No entanto, o PSB pede a retirada da obrigatoriedade de descendentes, além da redução da idade mínima para 18 anos.
A ação está nas mãos do ministro Kassio Nunes Marques. A legislação original (9.263/1996), conhecida como Lei de Planejamento Familiar, foi interpretada como arbitrária por impor requisitos para a realização de cirurgia voluntária. Além do aval expresso do cônjuge para o procedimento, exigia-se ser maior de 25 anos ou possuir dois filhos vivos.
Em 2023, entrou em vigor uma nova lei reduzindo para 21 anos a idade mínima e o fim da obrigatoriedade do cônjuge para submeter-se a procedimento voluntário. Os congressistas também mantiveram o prazo mínimo de 60 dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico.
Mesmo assim, o PSB aponta que a retirada de outras exigências tem como fundamento princípios do ordenamento jurídicocomo, por exemplo, dignidade da pessoa humana, liberdade reprodutiva e o controle próprio de fecundidade. O advogado Rafael Carneiro, que representa a legenda, ressalta que não cabe a intervenção estatal nesses casos.
“Não entendemos a razão constitucional para essa diferenciação, além do número mínimo de filhos, que é uma interferência absurdamente inconstitucional na liberdade do casal e na autonomia da vontade dos indivíduos. São esferas às quais o Estado não deve interferir”, disse ao Correio.
Segundo o PSB, a exigência de idade mínima e número de filhos “acaba por indiretamente criar um ‘dever de procriação’ para as jovens”. “A norma impugnada, todavia, exige que os indivíduos menores de 25 anos tenham ao menos dois filhos para que possam se submeter à esterilização cirúrgica. Ao fazê-lo, o dispositivo praticamente impõe um ‘dever de procriação’”, diz o partido na peça enviada ao STF.
A agremiação chama a lei vigente de ‘intolerável intervenção estatal’, que condiciona a prática de um direito fundamental – planejamento familiar – a um uso específico do corpo, da sexualidade e das funções reprodutivas, qual seja, a concepção de filhos”.
Autonomia
O fim da exigência de autorização do cônjuge para a realização de um ou outro procedimento impactou ainda mais as mulheres, pois o número de laqueaduras é cerca de 40% maior do que o de vasectomias na rede pública de saúde.
Na avaliação da advogada Giovanna Salomão, especialista em direito médico e da saúde, o debate sobre as mudanças é fundamental para garantir a autonomia dos indivíduos, especialmente as mulheres. “Aponta-se, primeiramente, ponto positivo à discussão, uma vez que debate acerca da liberdade da vontade de mulher, impedindo, portanto, a imposição do implícito dever de procriação a elas”, disse.
A última alteração também permitiu que o procedimento fosse realizado nas mulheres no momento do parto. A possibilidade teve o intuito de evitar um novo encaminhamento para a cirurgia. No entanto, para que o procedimento possa ser realizado, a mulher precisa registrar formalmente o desejo 60 dias antes de ter o bebê.
“Enxerga-se necessidade de uma das mudanças, visto que estabelecer um ‘número ideal’ de filhos não compatibiliza-se com o direito à autonomia privada, representando, em mesmo tempo, um pensamento arcaico acerca do que é esperado socialmente das mulheres”, ressaltou Salomão.
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