O Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou nesta semana uma resolução que veda ao médico a realização da “assistolia fetal” para interrupção de gravidez, quando essa tem mais de 22 semanas. O aborto é realizado, por lei, em situações de estupro, risco da gestão para a mulher e em casos de anencefalia. O Ministério Público Federal (MPF) enviou nesta quinta-feira (4/4) um ofício ao conselho, cobrando explicação sobre a decisão.
O procedimento médico citado provoca a morte do feto, antes da realização do aborto, e é feito por meio da aplicação de substâncias como cloreto de potássio e lidocaína, injetadas no coração do feto. A recomendação do CFM afirma que a prática não pode ser feita quando a mulher está com mais de 22 semanas de gestação e há possibilidade de “sobrevida do feto”.
“É vedada ao médico a realização do procedimento de assistolia fetal, ato médico que ocasiona o feticídio, previamente aos procedimentos de interrupção da gravidez nos casos de aborto previsto em lei, ou seja, feto oriundo de estupro, quando houver probabilidade de sobrevida do feto em idade gestacional acima de 22 semanas”, destaca a publicação.
De acordo com Raphael Câmara, conselheiro do CFM e relator da resolução, o conselho não se opõe a casos de aborto previstos em lei. No entanto, considera que após 22 semanas, os casos não configurariam mais aborto, mas antecipação de parto.
O Código Penal Brasileiro não define até quantas semanas o aborto legal é permitido. O artigo 128 define a prática como crime, com penalidade, mas permite em três exceções: estupro, risco de vida da mãe e quando o bebê é anencéfalo (sem cérebro). Nesses casos não existe nenhuma condição de tempo para praticar o aborto. O código também não define até quando é aborto e a partir de quanto tempo passa a ser considerado nascimento prematuro.
Atualmente, pela literatura médica, um feto com 25 semanas de gestação e peso de 500 gramas é considerado viável para sobreviver a uma vida extrauterina. No período de 23 a 24 semanas, pode haver sobrevivência, mas a probabilidade de qualidade de vida é discutida.
A normativa do CFM foi escrita em 21 de março e publicada na última quarta-feira (3/4) no Diário Oficial da União.
MPF cobra explicação
Com base na falta de amparo legal para a resolução do CFM, o MPF enviou um ofício ao conselho cobrando explicação sobre “qual a fundamentação técnica e legal” da resolução.
“O procedimento é prévio ao aborto e evita que o feto seja expelido com vida. Sem a assistolia fetal, há possibilidade de se configurar um parto prematuro, o que pode acarretar graves problemas de saúde em decorrência da formação incompleta do bebê. Ou seja, além de a gestante ter seu direito desrespeitado, ela e a criança precisariam suportar transtornos ainda mais severos devido a essas complicações”, diz nota do MPF.
“A legislação brasileira, no entanto, não fixa nenhum prazo de gravidez para que mulheres solicitem o procedimento. O direito ao aborto é garantido legalmente em qualquer estágio da gestação quando ela é resultante de violência sexual, assim como nos casos de anencefalia fetal e de risco à vida da mulher”, completa o texto.
O MPF concedeu o prazo de cinco dias úteis para que o CFM envie uma resposta.
O Correio tenta contato com o CFM para saber o posicionamento do conselho após a cobrança do MPF. O espaço permanece aberto para eventual manifestação da entidade.
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